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09/12/2019

“Estudar fora não é mais tabu”

Em universidades dos Estados Unidos, Canadá e Reino Unido, o passe do estudante brasileiro parece estar valorizado. Essa é a constatação do administrador Felipe Fonseca, diretor da consultoria educacional Daquiprafora, que assessora alunos do Ensino Médio no Brasil a se candidatar a uma vaga em universidades naqueles países e que desde o meio do ano vem fazendo o mesmo por estudantes do Sabin. “Posso dizer que, em quase 20 anos envolvido nesse ramo, este foi o ano em que vi a maior quantidade de universidades vindo para o Brasil participar de feiras, visitar colégios e fazer apresentações para recrutar alunos”. O curioso é que, segundo ele, o interesse é recíproco.

Na entrevista a seguir, Felipe comenta razões geracionais e socioeconômicas que têm levado cada vez mais famílias brasileiras a buscar uma graduação no exterior para seus filhos, os custos envolvidos nesse tipo de projeto e algumas das principais diferenças entre os processos seletivos e os modelos de Ensino Superior no Brasil e no exterior.

A procura de jovens brasileiros por graduações no exterior está crescendo? Por quê?
Certamente é uma tendência. Nos últimos dois anos, a quantidade de interessados cresceu muito, em todas as partes do Brasil, mas principalmente nas grandes cidades, como São Paulo e Rio. Os motivos são, primeiro, a disponibilidade de informações. O fato de ter mais jovens indo estudar fora faz com que mais gente saiba do assunto, tenha referências de outras famílias com boas experiências. Além disso, a situação das universidades brasileiras, principalmente as públicas, tem desanimado muitos alunos. São bem nítidos os problemas pelos quais algumas de nossas principais universidades têm passado: problemas de orçamento, de deterioração da infraestrutura, de currículos defasados. E outro aspecto que tem influenciado muito é que, nessa geração de pais que hoje têm filhos de 15, 16 anos, tem muita gente que já morou fora, seja estudando, seja trabalhando, já viajou muito. Estudar fora não é mais um tabu.

Estamos falando de famílias de que faixa de renda?
Para você ter uma referência, uma universidade americana vai custar aproximadamente uns 40 mil dólares por ano. Isso inclui a faculdade, a moradia, a alimentação e o seguro de saúde, que o estudante tem de ter. Tem algumas mais caras, outras menos, mas o custo fica nesse patamar. Isso sem nenhum tipo de bolsa. Com bolsa, esse custo pode cair para 15 ou 20 mil dólares anuais. E existem bolsas que podem cobrir até 90% ou até 100% do custo, mas são em pequena quantidade, e o estudante precisa ser fora de série para ter chances de obter uma bolsa dessas.

Quais os critérios para conseguir bolsas?
Podem ser critérios unicamente acadêmicos, como as notas do estudante no Ensino Médio, no SAT ou no ACT – duas provas que são como se fossem o Enem americano, que os alunos fazem aqui no Brasil mesmo. Existem bolsas
esportivas, para atletas de nível muito competitivo. Existem bolsas para estudantes de música, teatro ou alguma outra área artística, que são oferecidas a partir da análise de portfólio. E há universidades que oferecem bolsas por necessidade financeira da família; avaliam uma série de documentos, como declaração de imposto de renda e outras fontes de informação, veem o que a família pode investir e cobrem o resto. Mas isso só nas principais universidades, e os alunos têm de ser de altíssimo nível.

As redações pedidas por essas universidades costumam ter temas inusitados, às vezes de caráter bem pessoal. O que as universidades esperam com isso?
Diferentemente dos vestibulares no Brasil, o processo seletivo das universidades americanas, canadenses e inglesas vai considerar o lado acadêmico, mas também quem é o estudante. Aqui, você é basicamente a nota que você tirou; quem você é como ser humano, suas habilidades e interesses não são levados em consideração. Lá, eles têm um processo holístico: a qualidade acadêmica está nas suas notas, e, para saber quem você é, eles usam as cartas de recomendação dos professores e sua redação, em que você aborda as razões de ter escolhido aquele curso, experiências significativas que viveu, seus objetivos para o futuro… Isso cria a possibilidade de, qualquer que seja o tema, você dar uma abordagem muito única ao seu texto.

Não há o risco de o candidato “viajar na maionese”?
É muito grande. Por isso é importantíssimo que ele seja orientado. A application (“candidatura”) é como se fosse um quebra-cabeça, todas as peças têm de montar uma coisa só. Uma das palavras que mais uso é “coerência”. O que você fala na redação tem de estar relacionado com o que o professor vai falar, com o curso que você quer fazer, com as atividades que listou. Por isso é muito importante que o aluno tenha a ajuda de alguém com experiência nesse processo de montar o quebra-cabeça.

O candidato pode, então, receber ajuda antecipada para escrever suas redações?
Pode e deve. As universidades, inclusive, esperam que você busque suporte, porque isso demonstra que você sabe trabalhar em grupo, sabe ir atrás de recursos. Diferentemente dos nossos vestibulares, em que você faz uma redação ali sozinho, só descobre o tema na hora, lá você pode trabalhar nas redações durante semanas, fazendo revisões, pedindo ajuda no desenvolvimento das ideias. Elas esperam que você apresente o melhor material que puder.

Outra diferença diz respeito aos tais majors e minors das universidades lá fora. Explique o que é isso.
A maior diferença entre os modelos de Ensino Superior é que, aqui, você faz vestibular e conquista uma vaga em um curso específico. Nos Estados Unidos, você conquista uma vaga na universidade. Se você foi aprovado pensando em
fazer Jornalismo, mas chegou lá e desenvolveu outros interesses, decidiu fazer Economia, você pode, porque sua vaga é na universidade, não atrelada ao curso. A partir daí, o major vai ser o seu curso principal, e o minor é como se fosse uma especialização. Para ter um minor, normalmente você precisa de cinco a oito matérias; como no currículo desses quatro anos você vai ter uma série de eletivas, você pode usar todas para conseguir a especialização. É um modelo muito rico, porque, como você já está na universidade, tem aquele cardápio de cursos de todas as áreas, para você ir montando a grade de acordo com o que está a fim de estudar.